18/09/2007

Frangos à espera da morte

Um pequeno frango encontra-se, em meio a muitos outros frangos enjaulado em uma granja no meio do interior de Goiás. Ele pia e espera, ao lado de seus irmãos, querendo dizer alguma coisa. O alvoroço causado pela gritaria dos frangos, chama a atenção do dono da granja, o senhor Moacir. Ele caminha até o quintal e separa alguns grãos de milho, jogando-os para os franguinhos na tentativa acalmar os ânimos. Ao voltar para dentro de casa, Moacir não percebe a presença de dois garotos que adentram o quintal e, seguindo ordens de sua mãe, roubam duas galinhas para que o jantar da família não passe em branco.

O pai dessa tão desafortunada família, Cláudio, saiu de casa há algum tempo. Ele foi para Belo Horizonte para tentar arrumar um bom emprego. Tem uma aparência de dar pena. Conseguiu um emprego em uma construção civil, próxima à uma favela, onde mora num barraco. Cláudio atualmente está trabalhando no apartamento que, apesar de não estar pronto, já foi comprado por Émerson Castro, que é torcedor fanático e adora ir ao estádio de futebol nas horas vagas. Ele torce para o Atlético Mineiro, time conhecido como o Galo.

Acompanhando seu time no estádio, Émerson fica com raiva e frustrado quando vê que o goleiro de seu clube aceita um chute fraco do atacante adversário, que acaba entrando por baixo das suas pernas. Um frangaço! Ao chegar em casa, ainda fica mais irritado ainda quando seu filho, Júnior, pede uma carona para ir ao show do Kiss. Está doido para ver Gene Simmons esmagar pintinhos com os pés, como de praxe. Sua mãe lhe recomenda que faça um lanche antes de sair. A empregada rapidamente prepara nuggets de frango com ovos fritos.

O amigo de Émerson, Thiago, que não teve dinheiro para ir ao show, mata o tempo assistindo às notícias na TV. Ele vê a história de um garoto chinês de quatro anos que matou 443 frangos no grito, na província de Jiangsu. Thiago nota que o apresentador do telejornal gagueja na hora de dar a próxima notícia, sobre um fazendeiro que assassinou cruelmente dois garotos que lhe roubaram uma galinha no interior de Goiás. Mas Thiago não teve pena das crianças, do fazendeiro ou da mãe. Ele ficou com pena dos pequenos frangos mostrados no canto do vídeo, que tiveram seus gritos de protesto abafados pela fala do repórter. Mesmo não ouvindo nada, ele soube exatamente o que aqueles pequenos animais queriam dizer.

11/09/2007

Notas

“Sempre quis fazer parte de algo grande. Ao mesmo tempo, sempre admirei a beleza de uma vida simples, que não trazia grandes responsabilidades e nem nada que tomasse muito o meu tempo. Não penso no futuro, apenas aguardo o momento de mexer, fazer com que meus movimentos fizessem diferença para alguém, que quisesse me pinçar no meio da multidão. Mas sou apenas humano e me dói um pouco saber que nada posso fazer para mudar certo tipo de coisas, como por exemplo o seu comprometimento em relação a mim. Mas me senti grande enquanto estive com você, enquanto a gente podia conversar de mãos dadas. Parecia que tinha mais coragem de fazer as coisas, mais coragem de mudar o mundo, sei lá. Parecia que realmente eu fazia parte de algo grande. Grande pra mim. Mas agora é tarde e me sinto muito pequeno, pequeno demais para fazer alguma diferença para alguém e para ser notado. Pequeno desse jeito, vou acabar sendo pisado pela multidão, que se arrasta e não dá valor às coisas individuais e pensativas como eu.”

Com carinho, James

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— Na última vez que te vi você estava com um olhar tão tristinho. Queria que soubesse que a culpa não é minha. Na verdade, eu não sei bem o que aconteceu. Eu estou numa fase da vida que nunca tive antes. Não estou conseguindo me dedicar às coisas como gostaria. Estou mais dedicada a outro tipo de coisas, como os estudos e aos amigos. Você sabe que poderemos ser amigos. Bons amigos. Uma hora você vai encontrar uma pessoa legal, que te faça feliz. Existe tanta gente no mundo. Tanto para conhecer. Você também tem bons amigos e sempre se divertiu com eles. Sugiro que saia mais com eles, pelo menos por enquanto, para ver se esquece um pouco essa situação. Eu estou bem, mas às vezes ainda penso no que aconteceu. Por enquanto, acho melhor ficarmos afastados por um tempo, pelo seu próprio bem.

Ainda sua amiga, Lucille

PS: Depois lhe devolvo seus CDs.
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Memorando número 145/07

Prezado senhor James Carriolo

Comunica-lhe o Departamento de Recursos Humanos, por meio deste, que o senhor está oficialmente desligado de suas funções de auxiliar administrativo da Finhall Associados. O motivo se dá pela falta injustificada a duas semanas de trabalho. Solicita ainda o comparecimento ao RH para acerto de contas e desligamento.

Atenciosamente

Anthony Marshall, Gerente de Recursos Humanos

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Instituto Médico Legal
Laudo 1547/07


O médico legista, William Bakes, constata, após necropsia realizada no dia 06/11/2007, que o indivíduo do sexo masculino, identificado através de documentação como James Carriolo, de 23 anos, foi morto com uma bala de revólver calibre 38 que furou seu crânio e destruiu grande parte de seu cérebro. Ao que indica o relatório policial, o ferimento foi auto-infligido, tendo a vítima morrido cerca de 5 (cinco) minutos após o recebimento do ferimento.

Ratifico
William Bakes, Médico Legista